quarta-feira, 20 de junho de 2007

Mama África

O cinema hollywoodiano, recentemente, adotou uma tendência à filmes com tramas bem elaboradas de histórias (muitas vezes trágicas) do cotidiano. São exemplos: 21 gramas, crash - no limite, sobre meninos e lobos, entre outros. Porém, quatro filmes chamaram muita atenção nesse meio tempo por tratarem de um tema central comum, com diversos temas ou problemas inseridos dentro do mesmo universo, o africano. Hotel Ruanda, O senhor das Armas, O jardineiro fiel e, por último, Diamante de sangue, são deliberadamente, um soco no estômago.
Que a África é um continente com problemas sérios, um caos na Terra, uma parte do mundo esquecida e pobre, isso era do saber de todos, porém os filmes são incisivos e chocantes apesar de tudo. A guerra entre etnias nunca tinha sido mostrada de forma tão sangrenta e real como em Hotel Ruanda do diretor irlandês Terry George. Em nenhum outro momento a forma reveladora com que o contrabando e o tráfico de influências decidem quem vive e que morre no continente africano, tinha sido abordada como no ótimo filme, O senhor das armas com o ator Nicolas Cage. O diretor brasileiro Fernando Meirelles nos proporciona muita dor com a causa humanitária em favor dos africanos doentes e contra a indústria farmacêutica exploradora em o Jardineiro Fiel, em uma atuação impecável do já premiado Ralph Fiennes. A cobiça, o lucro e a influência estrangeira, aliados à consagração de Leonardo de Caprio e Djimon Hounsou fazem de Diamante de sangue um filme tocante e arrebatador.
Esse quadrado nos proporciona uma visão clara do continente negro. É impossível ficar indiferente à qualquer uma das obras. O problema africano é real, e não é só da África, muito pelo contrário, é responsabilidade de todos.

segunda-feira, 11 de junho de 2007

Vita Brevis

Um dos grandes pensadores do cristianismo, em verdade considerado por muitos o maior de todos eles, foi Agostinho Bispo de Hipona ou Santo Agostinho. Agostinho viveu entre os anos de 354 e 430 da era cristã e boa parte desses anos passou sob o julgo do "inimigo", entregue às frivolidades ardentes da carne. Sua mãe foi Mônica, posteriormente também canonizada. O bispo de Hipona conseguiu mostrar ao mundo um novo cristianismo impregnado de filosofia, adaptado ao neo-platonismo.
Um filósofo atual, famoso por seus livros elucidativos que promovem a filosofia de uma forma acessível a todos (o que é muito louvável) teve a felicidade de encontrar - segundo está escrito em uma de suas obras - um manuscrito na Argentina no final do século passado, relacionado ao filósofo bispo de Hipona. Tratava-se do Codex Floriae, uma carta de uma senhora chamada Flória Emília que tinha como destinatário o senhor Aurelios Agostinho, com o qual a autora coabitou por doze anos e teve um filho. Jostein Gaarder publicou o livro Vita Brevis no qual mostra a dor, o lamento e a angústia de Flória ao se ver separada do homem amado, separação essa causada pelas diferenças sociais (Flória era de uma casta inferior), como também pela conversão de Agostinho ao cristianismo.
Na carta ela comenta de forma breve a obra Confissões e traz uma nova versão da vida do santo. O livro, apesar de ter sido editado há mais de dez anos ainda é tido como mentira para muitos e verdade para alguns. Todavia é uma ótima leitura, sofre-se muito com Flória e o texto tem partes chocantes da visão desesperada e poética de uma mulher apaixonante. Se Flória escreveu ou não a carta não é o mais importante, a verdade é que o amor percorreu o tempo em diversas eras para chegar até aqui com uma força enorme e avassaldora.

terça-feira, 5 de junho de 2007

Tradições

Na última semana tive a oportunidade de conhecer a capital do Estado mais novo da federação, Palmas no Tocantins. Cidade com quase 230 mil habitantes, limpa bem planejada, bem iluminada. Uma cidade grande, mas pacata; não há muito movimento nas ruas mesmo na hora do rush e a cidade aproveita a noite para fugir do calor muito forte do dia. Há feiras noturnas onde se encontra de tudo inclusive lembranças do passado da cidade e que representam uma “tradição” local, o que é o caso dos artesanatos em capim dourado.

O que me deixou curioso foi o espírito do povo palmense, que trabalha em prol dos costumes locais e tenta colocá-los como tradição. Rapidamente lembrei-me da compilação de Eric Hobsbawn e Terence Ranger, A invenção das Tradições. Essa obra é composta de sete artigos onde se trata do tema “as tradições inventadas” em diversas partes da Europa. Hobsbawn explica a necessidade ou motivo de estudarmos esse fenômeno, e o faz (entre outras formas) dizendo que num mundo de mudanças tão rápidas é curiosa essa tentativa de retorno ao passado. No caso da cidade de Palmas tenta-se formular um passado, mesmo que muito recente, e usá-lo como substrato para o presente “tradicional” o que também é citado por Hobsbawn como uma das características das tradições inventadas.

É claro que minha intenção com essa postagem não é a de diminuir ou desmerecer a atitude do povo tocantinense, muito pelo contrário; todas as sociedades tentam valorizar o passado e por esse motivo são muito complexas. Aproximar-se de um passado recente é com certeza mais seguro e teoricamente melhor embasado do que remeter-se aos primórdios humanos em busca de respostas incertas.